Criadores & Criaturas



"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
"

(Carlos Drummond de Andrade)

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... Por do Sol em Serra Verde ...
Colaboração:Claude Bloc


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terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

POEMAS DE NICODEMOS

Forma & Forma

Abobrinha, macaxeira, açafrão,
Cebolinha, manjerona e jerimum,
Berinjela com alface e almeirão,
Alcachofra com farofa e guaiamum

Escarola, mandioca e pimentão
Batatinha, rabanete com ervilha
Beterraba, acelga, manjericão
Couveflor cambuquira com lentilha

Na forma de pão faço tijolo (^)
Na forma de tijolo faço pão (^)
Se na forma sem beleza, sem consolo (´)

Faço tudo que quiser minha intenção
Pois na forma e na forma cabe tudo (^), (´)
Mas nem sempre sentimento e emoção.


 João Nicodemos
Nicodemos apresenta seus trabalhos nos blogs:


*Poema publicado com autorização do autor

Caminhos

- Claude Bloc - 

Sigo caminhos
que seguem feito um rio
e acabam onde não sei

Caminhos que se encontram,
ou simplesmente se veem
em alguma estação
nas  sendas que escolherei...

Caminhos que eu faço
Caminhos por onde andei
E ainda me pergunto:
Por onde eu passarei?

Claude Bloc

Talvez
- Claude Bloc  -
Talvez eu nem possa
Talvez eu nem queira
Talvez não entenda
A intenção primeira.

Talvez eu nem saiba
Talvez eu nem queira
Talvez não entenda
A razão verdadeira

Vivo o momento
Vida bem ligeira
Talvez eu nem possa
Sair dessa inteira

Sei que é tão difícil
O ofício do dever
Será que eu devo
De tudo esquecer?

Claude Bloc

De profundis




                   DE PROFUNDIS


Um pequeno poema sobre o fim do mundo
com imagens a Crusoé, a terra desolada
e o claro enigma da máquina do mundo.

E agora, José? Você marcha, para onde?
Assassinado pelo céu, sob o tamarindeiro,
no poente como um paciente anestesiado.

A educação pela pedra no mar-canavial,
A estrela tão alta na minha vida vazia
e o seu grande coração transverberado.

Toca essa música de seda nessa noite,
noite, noite após noite, uma outra noite,
oh, lá onde o belo devora e gera o belo.

O dono da tabacaria sai à porta e boceja,
nós somos os homens ocos, empalhados,
mas que coisa, que fome é um homem?

Os cavalos da aurora derrubando pianos,
mas tudo é eterno quando nós o vemos
e sete rosas mais tarde rumoreja a fonte.

(Flui entre as pedras o silêncio de Deus.)

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Homenagem a Georg Trakl, Paul Celan, Czeslaw Milosz, Saint-John Perse, T.S. Eliot, García Lorca, Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Oswald de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Augusto dos Anjos, Cecília Meireles, Mário Faustino, Fernando Pessoa, Murilo Mendes, Alberto da Costa e Silva, e mesmo aos não citados diretamente como Jorge de Lima e Raul Bopp (além dos inevitáveis esquecimentos), que participam de uma forma ou de outra da minha poética.

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CONVERSA NA BEIRA DO RIO - Por Cacá Araújo



Um grupo de pessoas discutia à beira de uma das enormes crateras abertas pela força das águas do Rio Grangeiro, no centro da cidade do Crato. 

O religioso atribuía o caos aos castigos divinos em virtude dos pecados humanos nesta parte do mundo. Um político que se opunha ao prefeito, vendo que muitos circunstantes os ouviam, soltou, com aquela característica empolgação de palanque, depois de pigarrear ridículo de canastrão, um discurso em que se comprometia a honrar suas responsabilidades de homem público buscando soluções junto a seus aliados nos governos do estado e do país. 

Já um bêbado, ainda segurando um pedaço de casca de laranja na ponta dos dedos, disse que não acreditava nessa cambada de vereadores, deputados, senadores e nem no governador, pois se eles gastassem a metade do que investiram comprando votos daria para amenizar ou quem sabe resolver o problema. 

Depois de mais uma golada de cachaça, olhou em volta e perguntou pelo governador. Veio um desses aduladores de plantão e informou que sua excelência estava de férias no exterior, mas que havia mandado seu vice visitar a cidade, e, inclusive, ordenando que despachasse cem mil reais para ajudar no prejuízo catastrófico sofrido pelas famílias e comerciantes. 

Um estudante ia passando e de imediato protestou alegando que o governador não tinha contrato de trabalhador, mas função de gestor público e que esse negócio de férias não estava correto. Alfinetou, ainda, dizendo ser uma piada, insuficiente e humilhante o valor que o governo havia liberado. 

Com lágrimas nos olhos, uma professora alertou para a situação das famílias desabrigadas, das crianças e velhos sem agasalho e comida, e conclamou todos a se unirem numa campanha de solidariedade, até que os que se acham donos do poder resolvam ouvir o clamor da sociedade que agoniza e espera. 

Convicto, o ambientalista afirmou que eram necessárias a completa desocupação e revitalização das áreas onde outrora fora o leito original do rio, construção de moradias em localidades seguras para as famílias removidas, e urgente o combate ao desmatamento da Floresta Nacional do Araripe, proteção de morros e eficiente educação ambiental. Refeito um pouco de sua embriaguez, o bêbado gritou de seu canto afirmando que dinheiro para fazer tudo isso existe, sai do Cariri em forma de vil arrecadação para os cofres estaduais e federais e para retornar em benefício do povo é uma novela sem fim. 

A prefeitura não tem recursos e eles só liberam considerando a filiação partidária do administrador municipal, somou o nosso ébrio questionador. 

Um poeta que a tudo assistia tomou a palavra e deu o mote para a conquista do merecido respeito e do atendimento às reivindicações populares: o povo tem que sair às ruas, protestar, exigir a execução de medidas corretas para a reconstrução da cidade e prevenção de novos desastres. 

Ao redor dos debatedores já estava se reunindo uma multidão de populares, quando recomeçou a chuva e todos se dispersaram temendo a fúria das águas. 

O religioso se benzeu, segurou forte seu terço, correu e se trancou na igreja ao som de trovoadas retumbantes.

Cacá Araújo

Em comentário ao texto de Dihelson Mendonça: "  De quem é a culpa?"